Aviso aos novos talentos do automobilismo do Brasil: “É proibido sonhar com a Fórmula 1”

Por Americo Teixeira Jr. – Houve um tempo, pelo menos aqui no Brasil, que sonhar com a Fórmula 1 era palpável. Sem dúvida, um sonho sonhado por muitos e tornado realidade por poucos, mas que de toda forma não era algo de “outro planeta”, irreal, fora de propósito. Nunca foi fácil, mas pelo menos havia um caminho a seguir, uma estrutura que preparasse os futuros ídolos. Hoje, porém, esse modelo não existe mais.

O kart conduzia para as categorias de monopostos do regional paulista, Cansei de ver kartista “pegando a mão” de Interlagos nos carros da escolinha de Aldo Piedade para, ato contínuo, ingressar na fórmulas Ford, Chevrolet ou Renault, dependendo da época de cada um. Seguia-se, depois, para a Fórmula 3 Sul-americana, que foi uma formadora tão formidável de talentos que hoje somente vive desse passado, diante de um presente sombrio.

Com toda essa bagagem, o jovem piloto ia para a Europa e, não raras vezes, estourava. Apenas de cabeça, sem consultar manual algum, cito Rubens Barrichello, Tony Kanaan, Cristiano da Matta, Gil de Ferran, Enrique Bernoldi, Ricardo Zonta, André Ribeiro, Christian Fittipaldi, Bruno Junqueira, Helio Alves de Castro Neves (ainda não era Castroneves), Antonio Pizzonia, Nelsinho Piquet, Gualter Salles e tantos outros que chegaram na Europa e deixaram suas marcas. Alguns ficaram, outros foram para os Estados Unidos, outros abandonaram o sonho.

Independentemente disso, esse grupo chegou entendendo de carro de corrida. Tendo passado por várias categorias e acumulado experiência durante anos, pode ter chegado no Velho Mundo sem saber o que significava steering wheel e overtake, posto a falta de domínio do idioma, mas bastava entrar no carro para o pessoal das equipes européias entender que não estava lidando com qualquer um.

O automobilismo mudou. O Olimpo, que sempre foi representado pela Fórmula 1 está cada dia mais distante pelos custos da categoria, que insiste, em pleno Século XXI, a tocar a sua vida como se o mundo se restringisse a seu paddock, alheia ao emporcalhamento mundial que impera em todos os cantos, inclusive no seu próprio “quintal”, a Europa.

Mas nós, aqui no Brasil, também fizemos a nossa parte e ajudamos a tornar mais distante ainda o sonho da Fórmula 1. O kartismo perdeu a sua capacidade formadora por causa dos custos. Esforços isolados não foram o bastante para reviver os tempos em que uma etapa do Campeonato Paulista reunia mais gente e era mais plural, no que tange a estados representados, do que o próprio Brasileiro.

O moleque que sai do kart não tem hoje para onde ir porque não fomos capazes de manter vivas as categorias escolas. Já tivemos tantas e tantos esforços foram feitos, mas em definitivo permitimos que elas morressem, sendo a Fórmula Futuro, oficialmente extinta hoje, apenas mais um capítulo nessa história da incapacidade brasileira na formação de talentos. Sobrou a Fórmula 3 Sul-americana cujo presente …. ora, o presente.

Então, o único caminho é pular todas as etapas e, do kart, passar direto para o automobilismo europeu para, com bons sacos de Euros, pagar para ter um aprendizado que sua terra natal não foi capaz de lhe proporcionar. Obviamente que essa capacidade financeira não é prerrogativa de muitos, escasseando o número de representantes brasileiros no automobilismo internacional, minguado ano a ano. Enquanto isso, nossas categorias de Turismo se ampliam num modelo padronizado, com altos e baixos, sempre à mercê dos ânimos financeiros dos inúmeros participantes que estão no esporte apenas como hobby.

Por tudo isso, seria bom olhar Felipe Massa e Bruno Senna com olhos menos críticos. Poderão ser eles, salvo alguma metamorfose, nossos últimos representantes na Fórmula 1, a mesma que um dia teve o Brasil brilhando e que hoje, diante do cenário da incapacidade brasileira de promover um automobilismo profissional e sustentável, poderá ser coisa do passado em breve. Claro que Felipe Nasr está galgando esse caminho, e tomara que consiga, mas é muito pouco para o que o Brasil já representou.

Acho que a imprensa tem parcela de culpa, pois o espaço é muito pequeno para o automobilismo local, em muitos casos, quando comparado à Fórmula 1. Pais de pilotos que pagam “rios de dinheiro” no kartismo também fazem parte da lista, pois esquecem que o kartismo não é um fim, mas apenas um meio. Dirigente preocupados com taxas de inscrição e não com o fomento do esporte, ganham também uma cadeira cativa nesse rol. O empresário que não investe na base, mas só nas categorias que estão na Globo, também tornaram mais difícil a caminhada. Mas, sobretudo, “louva-se” a Confederação Brasileira de Automobilismo, cuja miopia é a principal responsável pela fixação dessa norma: É PROIBIDO SONHAR COM A FÓRMULA 1. É mais simples do que andar para a frente. Em se tratando de Fórmula 1, “colhemos” o que “plantamos”. Como não “plantamos”, não temos o que “colher”. Ponto final.

 

9 Comments

  1. Geraldo 28 de maio de 2013 at 17:51

    Tem o programa da SAE para incentiva estudandes de engenharia a por em prática o aprendizado em carros BAJA ou Fórmula (http://www.saebrasil.org.br/eventos/programas_estudantis/formula2013/Default.aspx).
    Se organizassem campeonatos com a estrutura dessas escolas para formar engenheiros e pilotos, poderia ser interessante.
    Que tal sortear pessoas experientes no automobilismo e mesmo os pilotos nos carros em cada etapa de um compeonato. Tipo jóqueis para conduzir os cavalos.

    Reply
  2. tirano 16 de março de 2013 at 3:38

    Infelizmente é mais um sonho levado pelo vento e pela visão superficial desta mídia corporativista que só serve a um propósito…favorecer aos ricos e iludir as demais classes sociais!!!!!

    Reply
  3. Andreas Barkmann 27 de junho de 2012 at 8:54

    É, realmente, um vergonha. Porquê é tão difícil termos um objetivo comum? Porquê não podemos lutar pelos mesmos ideais e deixar os nossos próprios interesses de lado em troca do bem comum? Isso é reflexo de atos em vários escalões de nossa sociedade. Vejam o desastre em nosso futebol, quando se fala em cúpula.

    Espero que as coisas melhorem, mas é provável que ainda demore um pouco. O pessoal que está lá em cima ainda quer destruir mais para depois quem realmente quiser fazer possa entrar em cena.

    Reply
  4. Lazinho 20 de abril de 2012 at 9:45

    Concordo com tudo o que foi dito e para reforçar, não podemos nos esquecer o que a Fox fez recentemente, ao tirar o Speed Channel e colocar o Fox Sports com programação relacionada a futebol, deixando os amantes do automobilismo de lado.
    Quase não tem né… Hoje temos o mesmo jogo passando em 2, 3, 4 canais… E o automobilismo fica relegado… Stock car com duração reduzida para encaixar na grade de programação da Globo, etc.

    Reply
  5. Rafael Vieira 19 de abril de 2012 at 12:08

    Carlos, realmente não tinha conhecimento dessa categoria e fiquei bastante surpreso com o que vi. Baita categoria, com muitos carros no grid e belissimas disputas na pista. Tenho certeza que muito em breve vou desprender meus esforços para sair de São Paulo até o Sul para ver pessoalmente alguma etapa da Fórmula 1.6, meus parabéns.

    Reply
  6. Rafael Vieira 19 de abril de 2012 at 11:57

    Américo, outro fator que incluo aqui como grande colaborador para a catastofre do nosso automobilismo nacional é multinacionalização de marcas brasileiras, onde por muito anos foram o apoio do Brasileiro mundo afora, cito exemplos como Arisco (comprada pela Unilever), Arno, Brastemp, entre tantas outras, que após sairem da mão de donos de verdade e irem para Board de acionistas, deixaram de vez o interesse em fazer do automobilismo meios de divulgação da mesma (vide que RedBull tem um dono ainda e o cara investe demais em Esportes em geral), pois as emissoras também não tem colaborado em nada, vide que na edição de segunda-feira (16/04/2012) do Globo Esporte, edição pós GP da China e etapa de Curitiba da StockCar, não foi gasto 1 segundo se quer com essas corridas, nada foi falado, exposição ZERO, então fica a questão, o que fazer? Vc colocaria seu dinheiro no automobilismo nacional? O que a CBA tem como planejamento para 2013 e 2014? Sem esses detalhes, nada vai adiante.

    Reply
  7. Carlos Giacomello 19 de abril de 2012 at 8:30

    Volto a insistir. Temos aqui no RS o maior campeonato regional de Fórmula do Brasil. Temos também 4 autódromos. E temos uma coisa que é de extrema importancia; custo baixo, comparado com o F=Futuro e a F-3.
    Para maiores detalhes, acessem http://www.formulars.com.br.

    Reply
  8. Jorge Kraucher 19 de abril de 2012 at 1:49

    Américo, como de praxe, suas colocações foram perfeitas. Eu apenas acrescentaria uma pergunta: porque o distinto Sr Cleyton Pinteiro, que em sua primeira entrevista após a eleição para a CBA declarava cheio de orgulho que “Nós estamos trabalhando para o surgimento de uma nova categoria” (como se ele e o bando de incompetentes que o cercam tivessem feito algo além de homologar os regulamentos)não vem a público agora e declara que “Nós estamos extremamente felizes em ter ajudado a dar fim a mais uma categoria”?

    Reply
  9. Alexander 19 de abril de 2012 at 0:10

    100% de acordo, Amėrico. Não creio q a Fórmula Futuro fizesse muita diferença, mas não sermos capazes sequer de formar pilotos em casa é realmente lastimável. Abs.

    Reply

Leave A Comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *