quinta-feira, abril 18, 2024

MP inclui CBA e Vicar em ação de improbidade e bloqueia bens

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CBA oferece sede, no Rio de Janeiro, como garantia à determinação de indisponibilidade de bens

O processo envolve também a ex-prefeita Dárcy Vera e foca a Stock Car de 2010 em Ribeirão Preto

Defesas da CBA e Vicar repudiam denúncias e pedem extinção do processo sem apreciação do mérito

Por Américo Teixeira Junior

Foram cinco os eventos da Stock Car realizados na cidade de Ribeirão Preto, entre 2010 e 2015 (Foto Duda Bairro/Vicar – 06.06.2010)

Realizada no dia 6 de junho de 2010, a primeira etapa da Stock Car em Ribeirão Preto deixou um rastro de problemas para a ex-prefeita Dárcy Vera, Confederação Brasileira de Automobilismo e Vicar Promoções Esportivas. O Ministério Público do Estado de São Paulo, Promotoria de Justiça de Ribeirão Preto, propôs ação civil pública de improbidade administrativa e, ainda, a indisponibilidade de R$ 1 milhão de cada parte para ressarcimento dos cofres públicos. Para evitar bloqueio das respectivas contas, a CBA ofereceu como garantia a sede da entidade, localizada na cidade do Rio de Janeiro, e a Vicar juntou aos autos um seguro fiança. A ação corre no Foro de Ribeirão Preto e o processo tem o número 1042927-71.2018.8.26.0506.

PROPOSITURA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Assinada pelo promotor Sebastião Sérgio da Silveira em 12 de dezembro de 2018, a contestação se deu porque o Ministério Público (MP) não reconheceu como correta a tramitação dos recursos federais que permitiram as etapas da Stock Car na cidade. Agora sob a alçada do juiz Reginaldo Siqueira, da 1ª Vara da Fazenda Pública, a entidade desportiva e a empresa promotora já apresentaram suas defesas e não há data marcada para o julgamento. Na verdade, nem se sabe se haverá julgamento, pois a fase atual é preliminar, não tendo sido ainda acatada ou arquivada a denúncia.

Na época, a CBA era presidida por Cleyton Pinteiro. Já a Vicar tinha sua presidência ocupada por Carlos Col e Maurício Slaviero respondia pelo posto de diretor geral.

No fim de semana que marcou a estreia da Stock Car em Ribeirão Preto, o então presidente da CBA, Cleyton Pinteiro, entregou à prefeita à época, Dárcy Vera, o termo que oficializou a prova na cidade paulista (Foto Duda Bairros/Vicar – 05.06.2010)

CBA oferece sua sede como garantia, mas não podia

Fato é que, mesmo assim, já causa transtornos. Responsável pela relatoria, o desembargador Borelli Thomaz acatou preliminarmente a indisponibilidade de bens. Diante disso, CBA e Vicar buscaram alternativas.

Em resposta ao Agravo de Instrumento número 2061894-79.2019.8.26.0000, a CBA destacou a sua condição de entidade sem fins lucrativos e, na hipótese de haver um bloqueio da ordem de 1 milhão, tal medida paralisaria suas atividades. Por esse motivo, a defesa ofereceu a sede da CBA, no Rio de Janeiro, para atendimento desse quesito.

O oferecimento foi aceito pelo juiz, que em 8 de maio determinou a assinatura do termo de caução dos “bens imóveis”. Estes estão matriculados sob os números 27.523 e 27.524 no Cartório de Registro de Imóveis do 9º ofício do Rio de Janeiro-RJ.

Só que, na prática, o oferecimento do imóvel representou uma infração contra o estatuto da própria entidade. CBA não poderia ter oferecido a sede como garantia sem a realização de uma assembleia. A necessidade de decisão colegiada foi reconhecida em manifestação da defesa em 17 de maio, mas com justificativas. A alegação foi a de que, ao oferecer a sede, a CBA pensou estar diante de uma indisponibilidade temporária e não o que chamou de “garantia real imobiliária”. No entender da defesa, o primeiro conceito dispensaria a assembleia, opção inexistente na prevalência do segundo.

Até a data da publicação dessa matéria, o juiz da Primeira Vara da Fazenda Pública da Comarca de Ribeirão Preto não havia se manifestado sobre as sugestões apresentadas pela defesa da CBA, que foram:

1 – Ofício do juiz ao cartório informando sobre a decretação judicial de indisponibilidade dos imóveis;

2 – Substituição dos imóveis por seguro-fiança;

3 – Se mantida a exigência do termo de caução, aguardar a realização da assembleia no prazo de 30 dias.

Seguro da Vicar não é aceito

No âmbito da Vicar a tramitação também não é tranquila. A apólice de seguro-garantia apresentada não foi aceita pelo Ministério Público e pela Fazenda Pública do Município de Ribeirão Preto. A alegação é de que existe prazo determinado para seu vencimento, que poderia resultar na sua não validade em caso de condenação ao término da ação, o chamado trânsito em julgado.

Diferentemente da CBA, a defesa da Vicar não fez uso de sugestões alternativas. Pelo contrário, reiterou de forma veemente o pedido de aceitação da apólice. Destacou que esta será renovada tantas quantas forem as vezes necessárias até o trânsito em julgado, apontando trecho da documentação que assegura tal obrigação da seguradora e da Vicar.  

A decisão sobre esse pedido também não havia sido comunicada até o fechamento dessa matéria.

Carlos Col (centro), Dárcy Vera e demais autoridades municipais em vistoria ao circuito de rua (Foto Duda Bairros/Vicar – 02.06.2010)

Convênio com Ministério do Turismo foi a origem

Os acontecimentos que resultaram na ação são datados de 2 de junho de 2010, quando foi firmado o convênio federal nº 736454/2010 entre a Prefeitura de Ribeirão Preto e o Ministério do Turismo, no valor total de R$ 7 milhões. O objetivo foi a realização das etapas de Stock Car na cidade e a primeira parcela, de R$ 2 milhões, bancou quase que na totalidade a prova daquele ano.

CONVÊNIO MINISTÉRIO DO TURISMO E PREFEITURA DE RIBEIRÃO PRETO

Paralelamente à assinatura do convênio com o Ministério do Turismo, a prefeitura havia assinado um outro com a CBA (019/2010). Dessa forma, a parcela recebida pela prefeitura foi repassada integralmente para a entidade técnico-desportiva. Esta, por sua vez, passou o dinheiro para a Vicar, detentora exclusiva dos direitos para organizar o campeonato da Stock Car.

CONVÊNIO PREFEITURA DE RIBEIRÃO PRETO E CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE AUTOMOBILISMO

Segundo o procurador de justiça, a transferência havida entre o Município e a Vicar, com a interveniência da CBA, não poderia acontecer por não estar prevista no convênio federal e, principalmente, por ser vedada pelo Tribunal de Contas da União. Ainda de acordo com a propositura, “a Vicar Promoções Esportivas S/A não emitiu notas fiscais dos valores repassados da União para o Município, deste para a Confederação Brasileira de Automobilismo e desta para a Vicar”.

Contas reprovadas

Essa questão, que agora atinge CBA e Vicar, transformou-se em enorme problema para Dárcy Vera a partir do momento em que a prestação de contas do valor inicial foi reprovada pelo Ministério do Turismo e, por conseguinte, a prefeitura foi obrigada a devolver o dinheiro com todas as correções. Ante ao valor recebido, de R$ 2 milhões, a devolução foi de exatos R$ R$ 2.309.069,41.

Entretanto, essa que parecia ser a solução, acabou por gerar a ação atual. Isso porque o valor devolvido saiu diretamente dos cofres municipais, mediante parcelamento em 24 meses. Foi uma alternativa para evitar que o acesso do município a outros convênios federais fosse bloqueado.  

A investigação aberta pelo Ministério Público Federal, como resultado da reprovação das contas junto ao Ministério do Turismo, custou à ex-prefeita a condenação de cinco anos de prisão, em regime semiaberto. Em abril do ano passado, o Judiciário considerou que a utilização dos recursos não foi comprovada, assim como classificou como ilegal o processo de devolução.

Mas não é por esse motivo que Dárcy Vera cumpre pena atualmente, pois cabe recurso. Presa desde maio de 2017 em Tremembé (SP), a ex-prefeita cumpre uma condenação de 18 anos, acusada de corrupção.

Defesas rebatem teses da promotoria e desferem críticas

Muitos pontos são comuns às defesas prévias apresentadas pelos advogados da CBA e Vicar, principalmente no que se refere ao pedido de arquivamento da ação, sem análise de mérito. A prescrição dos acontecimentos também é argumento reiterado. Para eles, a ação parte de suspeitas consideradas “infundadas”.

Assinada pelos advogados Felippe Zeraik e Bárbara Gomes Lupetti Baptista, da Zeraik Advogados Associados, a defesa prévia da CBA evidenciou de início o desconhecimento da promotoria sobre o funcionamento do esporte ao mencionar que, para ela, “os eventos de automobilismo deveriam ter sido realizados, exclusivamente, pelo Município de Ribeirão Preto, sem a participação da CBA e da VICAR”. Para tanto, enunciou os parâmetros estabelecidos pela Lei Pelé, que “exige a presença da CBA em provas nacionais”.

Ao classificar a suspeita como “infundada”, lembrou que o convênio entre a CBA e a prefeitura foi cumprido em sua integralidade, inclusive com a previsão de subcontratação de serviço. Dedicou também espaço para comentar que não houve qualquer envolvimento da entidade com o convênio federal, que foi assinado exclusivamente pela prefeitura junto ao Ministério do Turismo.

Disseram, ainda, os advogados da CBA, que caberia ao Ministério Público comprovar os danos efetivos ao erário público e não partir do que chamam de “mera suposição”.

Por fim, foi reiterado que “não existem elementos mínimos de materialidade de atos de improbidade, tampouco indícios”, razão pela qual foi solicitado que a ação não seja acatada. Por falta de dolo, a prescrição também foi sustentada.

Já a advogada Mônica Filgueiras da Silva Galvão, da Rodrigues Barbosa, MacDowell de Figueiredo Gasparian Advogados, apresentou a defesa prévia da Vicar, por assim dizer, “chutando pau da barraca”.

De início, classifica como “ilícito” o próprio pedido do Ministério Público por visar o “enriquecimento sem causa do ente público”, visto que CBA e Vicar nunca tiveram relação com o convênio federal.

Destacando que a Vicar realizou o evento na exata medida, rebateu a afirmação de que o promotor se apropriara de valores sem as devidas comprovações. Diante dos serviços comprovados da Vicar, a defesa desafiou o MP a “demonstrar a prática dos atos pela Vicar lesivos ao patrimônio público”.

Manifestou também, a defesa, incredulidade pelo fato de a relatoria, “apesar das frágeis alegações”, ter determinado o bloqueio de bens. Apontou detalhadamente que a Vicar se limitou a organizar e a realizar a competição e não teve qualquer benefício diante da decisão unilateral da prefeitura em devolver valores para o Ministério do Turismo.

Por fim, além do pedido da extinção da demanda sem apreciação do mérito, a defesa pediu “medidas enérgicas de repressão contra essas condutas” do Poder Judiciário, visto o “manifesto exercício abusivo do direito de ação do MP”. Acrescentou que o órgão merece condenação a arcar com o “ônus de sucumbência”, que é quando o MP tem de arcar com as despesas e honorários de partes denunciadas inapropriadamente.

A ex-prefeita Dárcy Vera não exerceu o direito de apresentação de defesa prévia.

Átila Abreu foi o primeiro vencedor da Stock Car em Ribeirão Preto (Foto Duda Bairros/Vicar – 06.06.2010)
Capa/Destaque: Dárcy Vera beija a placa de lançamento. Foto Duda Bairros/Vicar - 02.06.2010

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