Com a Fórmula Truck tentanto “renascer das cinzas” e com o campeonato do grupo dissidente ainda no papel, a modalidade passa por sua maior crise
Por Américo Teixeira Junior
A Fórmula Truck nunca viveu um momento tão dramático como o deste fim de semana no Velopark, local da abertura do campeonato brasileiro de 2017. Desabaram o grid, o equilíbrio técnico e a quantidade de pilotos com carreiras de destaque na categoria. Sobraram dificuldades. Mas apesar de nove pilotos na pista gaúcha, 3s443 separando o pole de seu companheiro de primeira fila e de apenas dois pilotos oriundos da formação que prevaleceu até o final do certame passado, o evento permanece existindo.
“Já comi muito filé mignon na Truck e não seria agora, que tem de roer osso, que iria pular fora“. Essa frase, ouvida hoje nos boxes do Velopark, dá bem uma ideia do estado de espírito do pequeno grupo restante. É altamente significativa a capacidade de não desistir de Dona Neusa Navarro e sua equipe, mesmo diante de um quadro tão grave. Mas se essa coragem é motivadora e passível de angariar novos apoios, a empresária sabe que é possível fazer uma ou outra corrida na raça, como é o atual caso, mas não um campeonato inteiro.
A corrida do Velopark é repleta de simbolismo. É como se a categoria desse um recado: “Apesar de tudo, estamos aqui, e com apoio vamos mais longe ainda“. Dona Neusa tinha de fazer esse evento, por mais pobre que fosse, para honrar o contrato com a CBA e ganhar fôlego para continuar tentando se recuperar, mostrando que, se “cair”, “cairá” lutando.
Não há espaço para duas categorias de caminhões
A categoria criada por Aurélio Batista Félix vive nessa penúria porque o grupo dissidente, que deixou a Fórmula Truck, é numérica e qualitativamente maior. A cisão foi resultado de uma profunda diferença de opiniões sobre a maneira de como conduzir o evento, a tal ponto que hoje não há meios de reconciliação, independentemente de qual lado possa eventualmente ter razão. Para piorar a situação, demorou demais a renovação do contrato entre a categoria e a CBA, elevando ao grau máximo as incertezas em torno do futuro da Fórmula Truck.
Por força da ruptura, esse mesmo grupo que já se faz ausente das atividades no Velopark se movimenta no sentido de criar uma categoria alternativa, o que permitiria a seus líderes colocarem em práticas os conceitos que consideram mais corretos. Há de se considerar, entretanto, que essa tarefa não tem indicativos de que será fácil, mesmo envolvendo nomes como Renato Martins, Djalma Fogaça e Roberval Andrade, para citar apenas três importantes competidores e donos de equipe. É sabido que o pensar enquanto piloto e chefe de equipe é muito diferente do pensar enquanto promotor. Então, salvo a existência de grandes patrocinadores e da contratação de um promotor experiente, há de se supor que as pedras no caminho não serão poucas.
Independente das razões que resultaram na cisão e da capacidade de cada um dos lados reagir ante o quadro atual, é pouco provável que haja no médio prazo espaço para duas categorias de caminhão no automobilismo brasileiro. Não é difícil imaginar uma coexistência no curto prazo, como aconteceu no desmonte da então próspera GT3, mas a partir de um certo tempo é algo que precisará ser provado ser possível, o que hoje não parece viável.
Não é pessimismo imaginar que, em de fato havendo um segundo campeonato, um deles acabará desaparecendo. Mas também é verdade que muitos achavam uma loucura corridas de caminhões e o que se viu foi uma competição gigante que contrariou todos os prognósticos. Só o tempo dirá se aos “brutos” também está reservada a tarefa de contrariar a tão amplamente comprovada regra de ser a cisão o caminho do fim, pelo menos para um do lados.